1649-014

Aqui suplantam-se os intelectuais...

quinta-feira, março 06, 2008

Não é nova a questão da intervenção do governo, naquilo que, as autarquias entendem ser o seu núcleo intangível de autonomia. Ora, a necessidade de encontrar responsáveis para as desarticulações entre as autarquias e o governo no rescaldo das cheias em Lisboa – que numa dúzia de horas alagou toda esta área metropolitana (!) –, foi o último caso desta manifestação de quando e como deve o governo intervir, naquilo que, de principio, seria uma competência autárquica.
Juridicamente, a supremacia constitucional do governo no quadro da administração pública, pela relação tutelar que exerce sobre a administração autónoma, não se esgota neste poder tutelar, mas deve centrar-se sim nele, determinando a caracterização enquanto relação jurídica de tutela administrativa. O que isto quer significar é tão só o seguinte: por existirem motivações de prossecução do interesse público – de exercício ou de salvaguarda das situações plasmadas na lei –, o órgão tutelar (governo), mediante a verificação do incumprimento da lei (v.g. por violação de regras urbanísticas ou por desoneração de deveres de higiene e salubridade por parte dos órgãos municipais), deve poder intervir quando a actuação ilegal das autarquias ponha em causa interesses públicos que ao governo caibam salvaguardar. Todavia, no actual quadro constitucional português, não é liquido que tal seja possível.
Eis o drama: embora não duvide da que as autarquias podem e devem ser dotadas de mecanismos que permitam garantir a sua autonomia, se tivermos presente que, um amplo e significativo domínio de actos ilegais poderá subsistir sem que exista um adequado controlo, ainda que os órgãos governativos indagassem destas violações por forma de actuação preventiva, estaria ainda, por esta via, a administração central a condicionar a margem de autonomia municipal, ao interferir na gestão autárquica.
O que quer esta reflexão tão só significar é isto: independentemente das competências específicas cominadas aos órgãos descentralizados, há casos particulares de incumprimento da lei a que os entes governativos não se podem desonerar de averiguar. Sejam incumprimentos relativos a legislação das florestas, do planeamento urbanístico, do tratamento de águas residuais etc., o governo deve ter ainda, poderes para intimar as autarquias ao cumprimento e, no limite, havendo sério imobilismo autárquico, deve o governo actuar para salvaguarda dos direitos e interesses dos cidadãos.
É nestes termos que, no jogo do empurra das responsabilidades do governo para as autarquias, me parece que ambos os entes públicos saem “empurrados” por não garantirem os interesses efectivos dos cidadãos.

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